“ELITE NÃO ENGOLE LULA, COM OU SEM JOBIM”
O diretor-adjunto da revista Carta Capital, Mauricio Dias, disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta quarta-feira, dia 25, que a tentativa de Lula de fazer uma composição à direita com Nelson Jobim é inútil.
O diretor-adjunto da revista Carta Capital, Mauricio Dias, disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta quarta-feira, dia 25, que a tentativa de Lula de fazer uma composição à direita com Nelson Jobim é inútil.
Segundo Mauricio Dias, Lula é intragável para a direita. “E terminada essa crise nos aeroportos, essa tragédia lamentável com o avião da TAM, vão procurar outra. Vão cavar asfalto para encontrar minhoca”, disse Dias.
Mauricio Dias disse que a imprensa tem um problema político com Lula: fazer com que Lula não seja um eleitor importante em 2010, já que ele foi eleito em 2006, mesmo com a ação contrária da mídia, conforme mostrou um estudo do Iuperj. “Se a mídia não queria o Lula em 2006, não vai querer que o Lula influencie a eleição de 2010. O jogo é esse”, disse Dias.
Mauricio Dias disse que o Ministro Waldir Pires era visivelmente rejeitado pelos militares em função do DNA político dele. “O Ministro Waldir Pires foi um homem do Governo João Goulart, que sofreu um golpe dos militares em 1964”, disse Mauricio Dias.
Segundo Dias, Pires foi o primeiro Ministro da Defesa que fez um esforço e que conseguiu colocar os militares sob o comando civil. “Porque não se pode esquecer em momento algum que o poder é civil”, disse Mauricio Dias.
Dias disse também que teve contato com vários militares que passaram pelo poder e que eles não engoliam a presença do Ministro Waldir Pires, porque foi de um governo constitucionalmente eleito e golpeado em 1964.
Leia a íntegra da entrevista com Mauricio Dias:
Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com Maurício Dias que é diretor ajunto da revista Carta Capital. Como vai Maurício, tudo bem?
Mauricio Dias – Tudo bem, Paulo.
Paulo Henrique Amorim – Maurício, como você analisa a decisão do presidente Lula de indicar o ministro Nelson Jobim para Ministro da Defesa, você que tem uma longa experiência de análises políticas.
Mauricio Dias – Paulo esse é mais um esforço, e eu anteciparia dizendo um esforço inútil, de fazer uma composição à direita. A verdade é que o Lula é intragável para a elite brasileira e, terminada essa crise, essa crise nos aeroportos, a tragédia lamentável com o avião da TAM, vão procurar outra, vão cavar asfalto para encontrar minhoca. Não adianta, no caso, você vê, saiu o ministro Waldir Pires que era visivelmente rejeitado pelos militares em função do DNA político dele, o ministro Waldir Pires foi um homem do governo João Goulart que sofreu um golpe dos militares em 1964. E eu tive vários contatos inclusive com alguns comandantes da Aeronáutica que inclusive passaram recentemente pelo poder e evidentemente que eles não engolem a presença do ministro Waldir Pires porque ele foi de um regime... de um governo constitucionalmente eleito golpeado militarmente em 1964.
Paulo Henrique Amorim – Agora, vão engolir o Nelson Jobim?
Mauricio Dias – Eu acredito que o ministro, ex-ministro, quer dizer o ministro aposentado do Superior...
Paulo Henrique Amorim – Do Supremo.
Mauricio Dias – Do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, é mais palatável, muito mais palatável. Evidentemente que é um homem...
Paulo Henrique Amorim – Ministro de Fernando Henrique Cardoso.
Mauricio Dias – De Fernando Henrique Cardoso, começou no PMDB, teve um papel ali muito interessante até...
Paulo Henrique Amorim – Na Constituinte.
Mauricio Dias – Exatamente. Mais depois, enfim, a partir daí ele se aproximou dos tucanos, enfim, e serviu ao governo Fernando Henrique. É uma tentativa clara que fazer uma composição mais conservadora do governo, à direita. Mas não adianta, não adianta. Isso tem sido uma constante no governo que tem recuado muito, recuado em certas coisas fundamentais e alguns dos seus ministros fazem um esforço impressionante e lamentável de se tornarem palatáveis para esse pessoal que não perdoa e é implacável. Eu me lembro aqui de uma frase do ex-ministro Palocci, quando ele entrou, a Mira passou para ele, “não adianta ser cordato e amável com esse pessoal”. Ele pagou na pele quando chegou a vez dele pagar. Enfim, não adianta, não é cedendo esse espaço político que...
Paulo Henrique Amorim – O que que o Lula, na sua opinião deveria ter feito?
Mauricio Dias – Paulo, veja bem, primeiro eu acho que havia em choque, essa rejeição ao ministro Waldir Pires, que é um homem íntegro, a um homem inclusive cordato. É evidente que tem uma crise aí e não há registro na história da humanidade de que um governo que tem uma crise e olha para o lado onde a crise está havendo e corta a cabeça do mais visível, que é o ministro Waldir Pires. Resistiu, resistiu, resistiu, mas chegou a um ponto, levou para o sacrifício. A questão é a seguinte, é muita ingenuidade, ou má fé, supor que o problema que está havendo nos aeroportos é responsabilidade do ministro Waldir Pires, então é claro que me parece, me parece uma situação muito parecida, muito semelhante a dos clubes de futebol, há um desarranjo ali por variadas razões, os melhores jogadores estão machucados... enfim, há algum problema e você pega o técnico...
Paulo Henrique Amorim – Um grande número faz corpo mole também, não é?
Mauricio Dias – Exatamente.
Paulo Henrique Amorim – Aquele pessoal que joga naquele time do PT de São Paulo faz corpo mole.
Mauricio Dias – Exatamente. Então, enfim, você pega e troca o técnico. Mas o problema não desaparece. É evidente que existe problemas na da aviação comercial grave. É claro também que as empresas forçaram a situação em Congonhas, inaceitável e todos os governos, esse e os anteriores acabaram cedendo às pressões e que evidentemente se existe uma tragédia, nesse momento, aérea era Congonhas, realmente estava superlotado estava, enfim. Essa decisão de fazer dali o aeroporto de... o eixo da aviação comercial para outros setores do país com a queda da aviação regional isso é evidente que criou problemas, claro. Agora isso não é, eu me lembro muito de uma frase do Nelson Rodrigues subdesenvolvimento, que dizia assim, “subdesenvolvimento é uma obra de séculos”. Esse problema que está acontecendo não é uma obra de agora é uma obra de décadas.
Paulo Henrique Amorim – Agora, deixa eu te perguntar uma coisa, e com relação à crise da mídia que, evidentemente com exceção da revista Carta Capital de que você é diretor, a crise da mídia está, evidentemente, partidarizada. Como é que você explica que o governo Lula não reaja a isso?
Mauricio Dias – O governo Lula tem uma, setores do governo Lula tem a impressão, pelo menos até há não muito tempo atrás, de que a mídia recuaria da posição que ela adotou, por exemplo para ficar num momento mais notório, na eleição do ano passado. Uma eleição onde já existem estudos comprovados do instituto Doxa, ligado ao Iuperg, um instituto que não tem nenhum vínculo partidário com o PT, que mostra como é que a imprensa se comportou naquele momento. Muito bem, e isso prosseguiu. Agora, houve um momento, ainda há em setores do governo uma crença de que a imprensa vai recuar e a imprensa não vai recuar porque aí soma-se, inclusive, problema político e problema de preconceito. Por exemplo, qual é o problema político? É claro que o presidente Lula disso de hoje é um eleitor fundamental em 2010, fundamental em 2010. Então é preciso fazer sangrar, sangrar, sangrar... A quem não interessa que o presidente Lula seja um grande eleitor em 2010? Procure essa resposta e você vai procurar, você vai entender um pouco o comportamento da mídia. Se a mídia não queria o Lula em 2006 não vai querer que o Lula influencie a eleição de 2010.
Paulo Henrique Amorim – Deixa eu te perguntar uma coisa, o jornal Valor de hoje publica uma reportagem dizendo que o presidente Lula procura se aproximar do governado José Serra e fazer um acordo para evitar a oposição de Serra especificamente no caso da crise aérea. Como é que você interpreta, se essa especulação, se essa informação for verdadeira?
Mauricio Dias – Não, eu acho que o presidente Lula tem procurado a aproximação com José Serra. E tem procurado também com o governador Aécio, que são dois que estão falando aí que são dois candidatos em potencial do PSDB para 2010. Só que tem que hoje o governador Aécio, de Minas, tem uma aliança amada, potencial com o ex-governador Alckmin. Ou seja, e se você olhar para o lado governista você não tem muito claro ainda, ou aliás não é nada claro, de qual vai ser o jogo do PT e do presidente Lula na eleição de 2010. O Lula está tentando fazer aquela política pendular entre o governador Serra e o governador Aécio para tirar alguma vantagem nisso, coisa que o doutor Getúlio Vargas fazia com muita eficiência e fez durante a Segunda Guerra, entre os aliados e os alemães e acabou arrancando para a gente, para o país, a Companhia Siderúrgica Nacional. Enfim, a política pendular. O Lula está fazendo uma política pendular. Porque não há um candidato do PT visível, não há um candidato da base governista visível. A revista Carta Capital publicou essa semana uma projeção da eleição de 2010 que deve ser vista com muitas reservas porque é muito precário você analisar...
Paulo Henrique Amorim – É muito cedo.
Mauricio Dias – E muito cedo. Mas de qualquer forma você tem ali uma coisa muito interessante. Individualmente, se a eleição fosse hoje, o Governador José Serra seria o mais votado e individualmente, se você olhar o voto, porque foi testado o nome do deputado Ciro Gomes e o nome da Ministra Marta Suplicy. A soma do Ciro com a soma da Marta, que é a base do Governo dá mais que a votação do Governador Serra. Ou seja, projeta uma disputa muito árdua. E quem está no poder, evidentemente, tem muita influência nisso, que é o Presidente Lula. Então a questão continua fazer o Governo sangrar e Lula sangrar até chegar em 2010. Terminada essa crise dos aeroportos e todos nós torcemos para que isso se restabeleça o mais rápido possível...
Paulo Henrique Amorim – Como consumidores, antes de qualquer coisa.
Mauricio Dias – Exatamente. Vai surgir outras, não tenha dúvida. Porque tem sido assim, uma sucessão de crise atrás de crise.
Paulo Henrique Amorim – Você que já viu muita água por baixo da ponte, você já viu a mídia brasileira tão unida e tão feroz?
Mauricio Dias – Nunca! Nunca! Teve um momento que houve uma aproximação disso, foi em 64, exatamente, quando a mídia toda apoiou o golpe de 64. Inclusive alguns arautos aí hoje da liberdade de imprensa apoiaram o golpe e acabaram, enfim, tendo um papel...
Paulo Henrique Amorim – Estadão, O Globo, a Folha, todos eles...
Mauricio Dias – Todos eles. Mas houve um acordo. Há um livro maravilhoso de uma americana mostrando que houve um pacto naquele momento para que o golpe se desse de uma maneira consensual. E só depois, quando veio o AI-5 é que começou haver uma...
Paulo Henrique Amorim – Você se lembra o nome desse livro, dessa professora?
Mauricio Dias – Paulo, não me lembro. Mas é publicado pela Editora da Fundação Getúlio Vargas.
Paulo Henrique Amorim – Nós vamos atrás disso para ajudar aos nossos internautas.
Mauricio Dias – É um livro muito interessante. É um livro que mostra o acorde que foi feito com a imprensa naquele momento.
Paulo Henrique Amorim – Haveria um acordo hoje? Ou não precisa?
Mauricio Dias – Paulo, não precisa. Quer dizer, não precisa explicitar. Os gregos têm uma expressão chamada agrafa dogmata, que é a lei não escrita, é o acordo não escrito.
Paulo Henrique Amorim – (risos)... Mauricio, você está impossível...
Mauricio Dias – (risos)... É que eu vi so “300 de esparta”.
Paulo Henrique Amorim – (risos)... Bom, em resumo, você acha que essa escolha do Nelson Jobim não resolve o problema...
Mauricio Dias – Não vai resolver, não vai resolver. Olha aqui, vou fazer uma impropriedade aqui: se a questão da crise fosse substituir o Ministro Waldir Pires, o Presidente Lula já devia ter feito isso há muito tempo. Evidentemente que não é isso. Não é possível, você está entendendo. Há vários fatores. Agora, o Ministro Waldir Pires é rejeitado pelos militares claramente. Tem toda má vontade com ele. E ele, anote isso, é importante: ele é o primeiro Ministro da Defesa que tenta efetivamente, que fez um esforço e que conseguiu em parte botar os militares sob o comando civil. Porque não se pode esquecer, Paulo, em momento nenhum, que o poder é civil. Malgrado surgir algumas pessoas como o Ministro Olympio Pereira da Silva Júnior, do Superior Tribunal Militar, em palavras pobres, pregar um golpe, alguma reação dos militares. Mas eu queria deixar claro aqui o seguinte: o Superior Tribunal Militar é apenas um cemitério de generais reformados. Não tem nenhuma importância na ordem das coisas e na seqüência desse raciocínio o Ministro Olympio não tem importância nenhuma.
Paulo Henrique Amorim – Muito obrigado Mauricio.
Mauricio Dias – Um abraço, Paulo.
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