As capas de nossos jornalões, nesta segunda-feira, correspondem à previsão do tempo para quase todo Brasil: mornas e úmidas.
As melhores notícias, contudo, não estão nas manchetes. O Estadão dá uma notinha, ainda na primeira página, muito pertinente.
Como se vê, não deram muita bola à ameaça de Serra. O ex-candidato à presidência da república havia dito semana passada que o PSDB não tinha nomes viáveis à prefeitura de São Paulo e que não participaria da campanha se o partido optasse por uma candidatura própria, defendendo com isso uma aliança com o PSD de Kassab. Entretanto, Serra não disse exatamente um absurdo, o negócio é que o único candidato com chances reais de manter a prefeitura longe do PT é o próprio Serra, que está correndo da raia, como bem disse o Nassif, num post que fez bastante sucesso na blogosfera.
Nos editoriais do Estadão, um texto típico do José Neumanne, embora sem assinatura, intitulado Ninguem Sabe, Ninguém Viu, sobre a nebulosa compra do Panamericano pela Caixa. Não fosse a Caixa estar apresentando resultados financeiros muito sólidos, essa história poderia render terríveis enchaquecas para o governo. Outro editorial é a enésima catilinária contra Chávez, que agora resolveu congelar os preços de uma série de produtos básicos, numa tentativa de combater a inflação.
A Folha traz uma manchete ridícula, de revista semanal de segunda categoria. Tudo isso para evitar falar do Kassab? No Painel, novamente temos uma sequência de notinhas enigmáticas sobre o imbróglio.
Pelo que entendi, o esquema do Kassab de inspeção veicular, iniciado na gestão Serra, foi exportado para o Rio Grande do Norte, onde foi descoberto e implodido pela Polícia Federal. Em São Paulo, seria aplicado em 124 municípios. A Lo Prete fala ainda Kassab conseguiu dar um cala boca no Ministério Público de São Paulo por seis meses, dando uma sinecura para o procurador Dráusio Barreto; até que surge o pentelho do Fernando Grella, que reabriu a investigação.
Inconformado com a negligência da Folha, dou uma nova fuçada no jornal e, finalmente, acho a reportagem na página C5. Pô, como alguém vai ver isso, se não tem uma chamada na primeira página? Não consta sequer na capa do próprio caderno onde ela é publicada. Sabe qual é a capa do Cotidiano? “Pais vão à Justiça para matricular os filhos”. Ok, assunto importante. Mas saca só a matéria que eles tentam esconder. Excepcionalmente transcrevo a íntegra da matéria por aqui, já que não consegui encontrar nenhum link aberto no site da Folha:
Caso Controlar pode fazer Kassab responder por crime
(link para assinantes)Ministério Público afirma que prefeito ajudou a fraudar documentoPolítico do PSD, que já responde a acusações de improbidade administrativa, nega irregularidadesROGÉRIO PAGNAN
DE SÃO PAULO
A decisão de ressuscitar o contrato com a Controlar, responsável pela inspeção veicular, deverá render mais problemas ao prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD).Além de responder a um processo na área cível, que já lhe custou o bloqueio de seus bens, o prefeito deverá ser alvo de investigação criminal.Os promotores Roberto de Almeida Costa e Marcelo Daneluzzi dizem que Kassab cometeu crime ao participar na fraude de um documento essencial na retomada do contrato com a Controlar.Eles, que encaminharam a denúncia aos colegas da área criminal, baseiam-se no depoimento da funcionária de carreira Regina Fernandes de Barros, diretora do Decont (Departamento de Controle da Qualidade Ambiental).Ela disse que recebeu pronto, de um assessor direto de Kassab, uma nota técnica que, em tese, legalizava a retomada do contrato em 2008.Ela afirmou que não sabia que o documento seria utilizado para um aditivo contratual, com efeitos retroativos.Esse documento era fundamental, dizem os promotores, porque o departamento dela, o Decont, “havia se posicionado pela irregularidade” dessa retomada.Para os promotores, a nota ajudou diretamente na venda das ações da Controlar, que ocorreu na semana seguinte, porque criou-se um “álibi” de “aparente legalidade” e, dessa, garantiu aos compradores que o contrato bilionário prosseguiria.A Justiça vê indícios de irregularidades na forma como a gestão Kassab repassou o serviço para a Controlar.A licitação que escolheu a empresa foi feita na gestão Maluf (1993-1996). Kassab fez parte da sustentação política de Paulo Maluf e foi secretário de Celso Pitta (1997-2000).Mais de dez anos depois, em 2007, Kassab desengavetou o contrato e decidiu usá-lo, mesmo após uma série de alertas sobre irregularidades feitos pelos próprios técnicos da prefeitura e pelo Tribunal de Contas do Município.Um parecer, da Secretaria de Negócios Jurídicos, de 2006, recomendou a rescisão.ÁREA CÍVELNa sexta-feira, a Justiça determinou o bloqueio dos bens de Kassab, do secretário Eduardo Jorge (Verde e Meio Ambiente) e de empresas e empresários ligados à Controlar.Mandou ainda a prefeitura fazer nova licitação para o serviço em 90 dias.Na área cível, Kassab responde às acusações de improbidade administrativa. Isso pode lhe render a perda do mandato e pagamento de indenização, por exemplo.Já na criminal, ele deverá responder a lei de licitações e, assim, é passível de dois a quatro anos de detenção.Kassab diz estar tranquilo porque não há, na visão dele, nenhuma irregularidade.Quem deve investigar Kassab é um grupo especial ligado ao procurador-geral de Justiça, Fernando Grella, único com competência para investigar crimes de prefeitos.
Bem diferente do que a Folha faz com ministros de Estado, as matérias contra Kassab, além de meticulosamente escondidas na seção mais discreta do caderno Cotidiano, oferecem um generoso espaço de defesa para Kassab:
OUTRO LADORetomada de contrato teve base jurídica, afirma prefeito
(link para assinantes)DE SÃO PAULO
O prefeito Gilberto Kassab disse ontem estar tranquilo com relação a uma investigação criminal contra ele, assim como está no processo na área cível. “No campo administrativo, agimos sob os critérios morais e operacionais.”De acordo com o prefeito, a declaração da servidora sobre a assinatura de um documento pronto ganhou uma dimensão exagerada por parte da Promotoria.“É uma coisa simples, mas estão fazendo um cavalo de batalha disso. A secretaria apontou [falta de funcionário qualificado na Controlar]. Depois, a prefeitura, como um todo, falou: ‘Então está bom, se é [só] isso, [a retomada do contrato] vai ser feita’.” Ao ser questionado sobre os detalhes apresentados pelos promotores, o prefeito afirmou que não poderia se aprofundar no tema por ser um assunto técnico. Então, resumiu sua versão. “A Secretaria do Verde mostrou uma restrição. E essa restrição foi corrigida depois”, afirmou.Kassab disse que não sabe se sua defesa deve recorrer ainda hoje com um pedido para liberação dos seus bens ou sobre a realização de uma nova licitação. “Não tem pressa. Não suspendeu o programa”, afirmou.Sobre os pareceres jurídicos que embasaram a retomada do contrato, o prefeito diz que eles não o “obrigaram” a isso. Mas o “permitiram”.“O importante é que há total embasamento jurídico. Jamais iria fazer algo que não tivesse fundamento.”Anteontem, ele disse que decidiu retomar o contrato porque a empresa “tinha direitos” e poderia acionar a Justiça para fazer prevalecer o contrato assinado em 1996.Ele voltou a dizer não haver “sacanagem” e que tudo se deu de forma transparente. “A primeira preocupação é o interesse público. A importância de controlar a emissão de poluente, no conceito de cidade limpa. A inspeção é o modo mais eficiente de controlar essa emissão.”
Por fim, O Globo ignora totalmente o caso Kassab, seus desdobramentos no Rio Grande do Norte, a prisão do suplente do Agripino Maia, João Faustino, etc. Prefere dar espaço para a oposição reclamar contra… Marcos Valério.
A ilustração de capa é foto do fotógrafo Dida Sampaio, da Agência Estado. É uma cobra devorando um calango.
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